Monday, October 5, 2015

CD: A Vista do Ponto - Saracotia

Vamos falar um pouco de Jazz e de música brasileira aqui? Quem me acompanha vai até estranhar! "O quê? Ele não está falando de Rock e Metal? Rápido, tragam o remédio dele!!" Mas não é nada disso, gente, calma! Eu tô bem, juro! Embora sim, minhas preferências predominantes sejam o Rock, o Heavy Metal e o Blues, isso não quer dizer que eu não posso apreciar outros gêneros, oras bolas! Aliás, uma das razões de eu ter inaugurado o blog foi para poder falar destes outros estilos que eu não posso falar escrevendo para o Whiplash.net, onde só se fala de Rock e Heavy Metal. Eu comecei a escrever lá faz muitos anos, e agora quis ampliar para mostrar esse meu outro lado. Vamos então falar do Saracotia. 

Eu descobri o Saracotia este ano porque eu fui no festival Sesc Jazz & Blues, e o trio era uma das atrações da noite de sexta, a primeira delas. Não fazia a menor ideia de quem eram, até porque eu não acompanho com frequência a cena da música brasileira; quando se fala em MPB e artistas de gêneros tipicamente brasileiros, eu sei o mínimo possível para não me passar por ignorante. Gosto de bastante coisa, gosto de Toquinho, Noel Rosa, Hermeto Pascoal, Tom Jobim, Chico Buarque, Baden Powell, Yamandu Costa, etc, enfim, conheço estes artistas e gosto de muitas de suas músicas, mas não vou atrás deles nem fico de olho no que eles lançam. Então, quando se trata de música brasileira, eu sei o suficiente para não passar vergonha. Meu lance é o Rock mesmo. Dos artistas que fazem MPB, meus grandes favoritos são Milton Nascimento e Ivan Lins, gosto demais do que eles fazem.

Mas eu fui até o Sesc curtir o som do Saracotia porque eu também sou um grande admirador da cena do Jazz, conhecendo aí diversos artistas do gênero, como Miles Davis, Thelonious Monk, Ella Fitzgerald, Billie Holiday, Herbie Hancock, Dizzy Gilespie, Lee Morgan, etc, enfim, eu não conheço também o trabalho inteiro de todos estes artistas, mas eu sou um grande admirador do que eles fazem. Adoro às vezes mudar os ares, deixar um pouco de lado o Rock, o Metal e o Blues que eu ouço com muita frequência, sentar e ouvir um bom artista de Jazz; se eu não curtisse tanto o Rock, com toda a certeza, eu seria um grande admirador de Jazz, mais ainda do que eu já sou.

Outra razão pela qual eu fui ver o trio, é porque eu gosto de conhecer novos artistas e talentos, tenho a cabeça aberta o bastante para me deixar encantar por gente nova que faça um som de qualidade, e também sou muito curioso, então eu comprei o ingresso do show e me sentei em um dos assentos do anfiteatro do Sesc para assistir à apresentação. Ao final dela, eu estava bem impressionado com eles! Havia gostado muito! Fiz até um artigo sobre o show aqui mesmo. Gostei tanto que resolvi comprar o disco deles. O próprio trio disponibiliza o álbum completo para download no próprio site, e de graça, mas o álbum custou só 10 reais, então eu comprei para apoiar estes caras. E o CD deles também é muito, muito bom! Já escutei várias vezes, nunca me canso! É justamente o tipo de música brasileira que gosto de ouvir.

O som deles é muito variado, é um Jazz Fusion com mistura de ritmos brasileiros. Tem classe, estilo, e dinâmica. É todo instrumental. E o instrumental do grupo engloba apenas três instrumentos principais, um violão, um bandolim e a bateria. Só! Ocasionalmente algum outro som de fundo, mas é bem passageiro, a complexa e muito estruturada harmonização que o grupo promove concentra-se basicamente nestes três instrumentos principais. O grupo se sobressai pelo "menos é mais", pela simplicidade encantadora de seu som.

Segundo o próprio grupo, o disco conta uma história. É engraçado pensar nisso, porque quando eu estava vendo o show deles, eu tinha exatamente essa sensação, que uma história sem palavras, somente com notas musicais, era contada a cada música. Os interlúdios entre as faixas com narração em francês e diversas sonoridades já davam vazão a esse conceito. E segundo o próprio grupo, a história se trata de um sertanejo que sai do campo e vai tentar a sorte na cidade grande, daí os diversos arranjos do disco em baião e ritmos nordestinos, representando esse personagem. Mas é deixado em aberto, até mesmo pelo próprio título do disco, a temática com a qual se encara as composições do álbum. Depende de qual ponto você consegue posicionar sua vista.

O disco inicia com a música "Forró-Bozó", que é um forró mesmo, tem aquele ritmo bem nordestino, mas com incursões instrumentais jazzísticas, inclusive aqui eles se aventuram e colocam algumas harmonizações de sanfona de fundo, eu lembro de no show deles ter escutado estas harmonizações. A música é muito agradável e tem muitos relampejos de Hermeto Pascoal. A segunda, "Dia de Sorte" é um samba padrão, mas com muitas quebradeiras de ritmo, tem harmonização de Jazz, mas beira a música progressiva, é bem melódica e agradável.

Eu me lembro de no show ter ficado maravilhado com o grupo conseguir representar bem uma unidade sonora. Os arranjos elaboradíssimos, sofisticados, claro, chamavam muito a atenção, mas eu não via músicos em momentos individuais na grande parte das vezes, eles funcionavam como uma unidade, um não existia sem o outro. É o caso do choro misturado com maracatu "Ócios do Ofício" e do bolero "Bolerando". E a quebradeira rítmica, assim como no jazz contemporâneo, ficava cada vez mais evidente de uma faixa a outra. 

Rola mais um samba, "Instante", com introdução falada em francês, e que me desculpem os músicos, mas eu não entendo francês, tenho que pedir ajuda aos universitários para saber o que a menina falou. Mas a música é bonita, é um samba-jazz muito elaborado, com passagens muito interessantes. "Pra Você" começa com uma introdução dramática ao piano, bastante introspectiva e que ambienta um clima bem intimista, desembocando no violão e em um ritmo que mistura jazz e valsa, fechando ao som de grilos e dando início à próxima faixa, o samba "Das Holandas".

"Speed Valsa" é realmente uma valsa bem acelerada e com mais quebradeira no ritmo e um arranjo bastante legal e contagiante, destacando o bandolim solo e as notas de baixo no violão. Tem um trecho intermediário que pára e constrói uma ambientação, para depois desembocar novamente no tema principal da música, é bem interessante. "Clovinho no Frevo" mostra um ritmo de frevo bastante dançante, sem é claro deixar de ter a quebradeira rítmica que permeou o disco até agora. Por último, "Por Querer Ficar" inicia bastante climática e com arranjos de violão para desembocar em um ritmo de baião belíssimo e com uma melodia doce e de uma beleza harmônica única, finalizando assim um disco de pura música brasileira de execução perfeita e com diversos momentos encantadores.

Ao final do álbum, o Saracotia me dá a certeza de que escutei um disco de música brasileira do mais alto calibre, com composições belíssimas, arranjos fantásticos, que prendem a atenção a cada faixa e que tratam com muito respeito a música brasileira de qualidade. Estou sinceramente curiosíssimo para escutar o primeiro disco do grupo, assim que conseguir encontrar, e venho aqui recomendar a todo mundo que curte Jazz-Fusion e música brasileira, ou até mesmo para quem não faz ideia do que seja, mas que curta música de altíssima qualidade, para irem atrás deste ótimo lançamento de 2015.

A Vista do Ponto (2015)
(Saracotia)
Nota: 10 / 10

Tracklist:
01. Forró-Bozó
02. Dia de Sorte
03. Ócios do Ofício
04. Bolerando
05. Instante
06. Pra Você
07. Das Holandas
08. Speed Valsa
09. Clovinho no Frevo
10. Por Querer Ficar

Selo: independente

Saracotia é:
Rafael Marquesbandolim de 10 cordas
Rodrigo Samicoviolão de 7 cordas
Marcio Silvabateria

Discografia:
A Vista do Ponto (2015)
- Saracotia (2012)

Site oficial: www.saracotia.com.br
Facebook: https://www.facebook.com/Saracotia-120116735090/timeline/

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