Wednesday, January 13, 2016

LIVRO: Pulp (Pulp) - Charles Bukowski

Nota: 10 / 10

No meu último editorial do blog, eu mencionei o desejo de postar mais resenhas de livros aqui. Pois bem, espero que este, seja o primeiro de muitos livros dos quais vamos falar este ano. Resolvi começar por este, não só porque se trata de um de meus autores favoritos, ou um de meus livros favoritos, por assim dizer; este livro mudou, em muitos aspectos, a forma como enxergo a realidade e a literatura do gênero a que se refere.

Mas não se trata apenas disso; esta obra também foi a que usei para realizar trabalho de pesquisa no ano passado, que foi o ano de inauguração de A Ciência da Opinião. Portanto, como forma de celebrar o momento, vamos falar do cara que nunca na vida teve nada a perder, e no entanto deu tudo de si pela sua grande paixão: Charles Bukowski.

Assim como muitos autores que resolvem desafiar as convenções, dar a cara a tapa, ser o estranho no ninho, a ovelha negra, entre muitos outros adjetivos, Bukowski sempre foi tido como o indesejável dentro da literatura americana de alto calibre. Apesar de ter vivido toda sua vida nos EUA, ele nasceu na Alemanha, e após completar 3 anos de vida, sua família se mudou para América, para poder escapar da pobreza após a derrota alemã na 1ª Guerra Mundial. Mas seus pais eram uns verdadeiros desequilibrados e sua família, extremamente desfuncional.

Dessa forma, o menino teve mais baixos do que altos em sua infância, mas foi crescendo e lutando com a vida, ao ponto de chegar ao colégio e, com a ajuda de um certo amigo dele, já aos 20 anos, se apaixonar pelos vícios da bebida, do cigarro, das drogas, entre outras coisas, incluindo o sexo sem compromisso e a vida itinerante. Dessa forma, passando por diversos empregos sem glórias, experiências, indo de bar em bar, vivendo a sua vida entre os tipos mais baixos de pessoas e ambientes possíveis, Buk, como a gente chama o "velho safado", foi enrijecendo sua persona e se desgostando da vida aos poucos, após passar uma série de decepções pelo seu caminho, vindo a se tornar o escritor que seria anos depois, quando encontrou seu agente John Martin e a editora Black Sparrow, que passaram a ser a vida do autor.

Buk fez da escrita sua maior grande paixão, talvez a maior de todas. Para ele, um sujeito amargurado e com um grau de sociopatia, era colocar o que pensava em um papel, ou então colocar uma arma na boca e puxar o gatilho. Reconhecido de fato apenas após sua morte por leucemia em 1994, Buk deixou uma coleção inimitável de escritos que contém ironias, sarcasmos, palavrões, sempre com suas narrativas corrosivas, ácidas, que desmontavam, desconstruíam, dilaceravam o cerne da sociedade americana e expunha as vísceras dessa sociedade. Dessa forma, dá pra se entender porque ele incomodava tanto as pessoas: por ser realista demais, sincero demais e honesto demais.

Das 6 novelas que escreveu, apenas uma delas não segue um tom autobiográfico na cara, exposto, como as outras, que é a que temos aqui em mãos. Na melhor tradição de seus escritos, e abraçando o gênero da literatura policial noir, com toques de literatura pulp fiction, todos gêneros que lia quando mais jovem, e pegando emprestado a tenacidade de Raymond Chadler, a retórica de Dostoyevski e a amargura e abandono de Ernest Hemingway, Bukowski narra as desventuras do detetive Nick Belane, que, na melhor tradição das histórias policiais, recebe a incumbência de achar o escritor Céline para uma tal de Dona Morte. Também recebe a missão de seu amigo John Barton de encontrar um certo Pardal Vermelho.

Desta forma, o detetive, que trabalha em um escritório precário, vive em um apartamento com goteiras, bebe à noite em bares, vai a corridas de cavalos, e tem relações casuais com mulheres, começa a ir atrás dos mistérios para os quais foi incumbido de resolver.  Há também um caso de suposto adultério que ele tem que resolver na história e um estranho caso de um cara que diz estar sendo perseguido por uma moça, que na história, se revela uma alienígena de um planeta distante. Porém, diferente de uma história policial clássica, o detetive simplesmente conversa com as pessoas ao seu redor e espera que os casos se resolvam por si próprios.

Esta letargia é ilustrada no livro pela crescente desilusão que o protagonista vai ganhando, sempre que se vê em um beco sem saída e não consegue sair de lá. Em contraste a seu enorme ego, vemos também sua grande fraqueza em seguir adiante em um mundo que parece não o querer por perto, privado de riqueza, conforto e qualquer tipo de reconhecimento.

E o mais intrigante de tudo: todos estes elementos, a letargia, a bebida, as mulheres, a angústia e a desilusão, bem como os seus casos, são elementos de metáforas que o autor se usa na história para representar algo em sua vida. Bukowski não deixa passar nada, sempre contando com a linguagem descompromissada de seu texto, como se estivesse em um bar lhe contando histórias, mas sempre com verdade e sinceridade, o que faz o teor da narrativa soar de forma bela e solene. Nos divertimos com o humor ácido e o palavreado sem meias-palavras, rimos com as situações, nos apegamos ao personagem protagonista, mesmo este aparentando ser um mala sem alça, e atentamente o seguimos em seu destino, no final da história.

Este é um livro que, diferente das novelas anteriores do autor que contam fatos reais de sua vida, narra uma ficção policial; no entanto, representa uma introdução muito satisfatória ao autor, uma vez que a história em si é uma grande metáfora de sua vida que possui um tom confessional absurdo e uma tônica de rito de passagem bastante emotiva. No fim das contas, tudo remete à famosa frase que o escritor deixou como legado para nós e que pela qual ele espera que as pessoas se lembrem dele: "encontre aquilo que você ama, e deixe isso te matar"; viva cada momento de sua vida pela grande e maior paixão de sua vida; o resto é simplesmente passageiro. E que a morte, no fim de sua jornada esteja tão sexy e gostosa quanto estava para Buk nos seus últimos dias. Um livro que eu recomendo altamente.

Pulp (1994)
Título em português BR: Pulp

Escrito por: Charles Bukowski

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