Eu estava na indecisão, mas no final, não resisti! Só mais um arco de histórias do Batman antes de fechar o ano, já que o Miller e o Azzarello não vão dar as caras até ano que vem. Eu nem pretendia fazer este arco do Batman, mas a história foi tão eletrizante, que eu tinha que vir aqui falar para vocês!
Mas este arco, eu vou fazer um pouco diferente. Quando falei sobre o arco da Corte das Corujas e de seu arco-continuação, o da Noite das Corujas, eu elaborei eles edição a edição. Endgame foi um arco que eu também conferi edição a edição, comprando as revistas, mas aqui eu vou falar sobre a experiência como um todo.
Esta é uma das narrativas mais marcantes que eu já li do morcego, e na minha opinião, a melhor história que Scott Snyder e Greg Cappulo escreveram para Batman.
Mas este arco, eu vou fazer um pouco diferente. Quando falei sobre o arco da Corte das Corujas e de seu arco-continuação, o da Noite das Corujas, eu elaborei eles edição a edição. Endgame foi um arco que eu também conferi edição a edição, comprando as revistas, mas aqui eu vou falar sobre a experiência como um todo.
Esta é uma das narrativas mais marcantes que eu já li do morcego, e na minha opinião, a melhor história que Scott Snyder e Greg Cappulo escreveram para Batman.
Vamos começar com um spoiler mais ou menos óbvio; não se preocupe, não é nada demais. A ideia por trás de Endgame, caro leitor, é matar Batman e Coringa. Sim, os dois antagonistas, ao final deste conto, "morrem" em uma caverna. Outras coisas não menos que bizarras acontecem nessa história, mas o objetivo de Scott Snyder e Greg Cappulo é esse mesmo, tirar o morcego de circulação... pelo menos até o seu retorno no final da linha Novos 52, aproveitando aí pra te dar outro spoiler. O quê? Você achou que dessa vez eles iriam mesmo matar o morcego por definitivo? Tolinho! Você não lê muito quadrinho, lê?
Eu não estou acompanhando o próximo arco de histórias dos Novos 52, Superheavy, aquele do Bat-Gordon, o arco do Gordon sendo o morcego na ausência de Bruce, naquela super-armadura azul que parece mais um coelho gigante. Não tenho muito interesse em arcos que não envolvam o morcego original diretamente, então talvez eu resolva ler depois de um tempo, mas não é uma promessa. Mas há outros arcos interessantes de revistas-satélite que eu talvez trate no futuro, como Detective Comics e Arkham Mansion, já tenho algumas coisas bem interessantes que eu vi por lá, como o arco envolvendo o vilão Anarquia. Vamos então a Endgame.
O arco de histórias foi publicado originalmente em seis partes, nos números #35 a #40 da revista mensal do Batman, nas edições originais americanas. Aqui no Brasil, a Panini pulou a edição #38 para dar mais ênfase ao título Arkham Mansion, ficando então a ordem brasileira diferente, sendo as edições nº 35, 36, 37, 39, 40 e 41. É bom esclarecer isso para quem for querer ir atrás do arco publicado por aqui. Outra coisa: conforme nos é informado na HQ, os eventos aqui apresentados acontecem após a série semanal Batman: Eternal, que durou 52 edições; eu não acompanhei essa série, então não posso opinar sobre ela. Se um dia eu vier a lê-la em formato encadernado, talvez fale alguma coisa, mas no momento, meu conhecimento se resume ao que eu narrar aqui nestas revistas mensais que eu acompanhei melhor.
A história se inicia nos mostrando a figura de um teatro, o Gotham Royal, e depois somos jogados direto na ação, onde vemos um grande perigo tomando Gotham de assalto, com Batman e seus aliados lutando contra isso, onde Batman aparentemente "morre". Na próxima sequência vemos que era um sonho, e vemos Alfred e sua... filha (???) Julia Pennyworth (isso que dá perder algumas edições da revista) com Bruce em uma espécie de quartel general, do alto de um prédio, no meio da cidade de Gotham.
Bruce está se recuperando de ferimentos (que eu suponho que sejam resultado de Batman: Eternal) e do efeito do gás do Espantalho, o que explica o sonho, quando de repente, a Mulher Maravilha arrebenta a janela e invade a base, agarrando Wayne e dizendo que veio para matá-lo. Isso tudo, segundo a narração, aconteceu a 29 minutos atrás. Corta para "agora", como nos é informado, e Batman tenta neutralizar Diana dentro de um mecha robô, quando o Flash aparece também com intenção de matar o morcego. Depois Aquaman; por fim, o Superman. Todos eles, por alguma razão, querendo tirar a vida de Bruce. Julia Pennyworth faz aqui o papel de "Oráculo", tentando ajudar, como pode, o Batman através da base de operações na torre. Exceto por Superman, Batman consegue neutralizar todos os outros heróis, e vemos, no final desta edição, o Super e os outros, exibindo sorrisos parecidos com o do Coringa.
Fiquei impressionado com esses desdobramentos quando li, o Snyder parece saber muito bem o que faz.
Na sequência, vemos o morcego aparentemente sofrer mais algumas ilusões, e continuar a receber os ataques de Superman, que está sob os efeitos de alguma toxina que o Coringa aparentemente deixou. Deu um mega trabalho, mas Batman consegue, de alguma maneira, deter o azulão com truque de sóis vermelhos e até mesmo um cuspezinho no olho de Superman contendo poeira de kriptonita. Não me pergunte, ele é o Batman! Feito isso, ele hospitaliza toda a Liga para se livrarem dos efeitos, e retorna para a sua base no meio da cidade. Bruce e Alfred tem uma discussãozinha, mas obcecado e determinado como sabemos que é, Bruce acaba vencendo a discussão e diz para Alfred e Julia irem para um lugar seguro.
Batman retorna aos escombros do abandonado Asilo Arkham para ver Eric Border e tentar descobrir alguma pista do paradeiro do Coringa. Acaba que, inocentemente, Batman entra em uma das celas enquanto fala com Border, mas Border é na verdade o Coringa disfarçado, e aprisiona o morcego. O Coringa provoca Batman, enquanto relata que todo o povo de Gotham está indo a loucura com a sua toxina, a mesma que transforma as pessoas em "Coringas", que as fazem perder a cabeça e agir segundo a personalidade insana do palhaço. A edição termina com o Coringa puxando uma arma e apontando para a cabeça do morcego, fazendo que vai matá-lo; ficamos na escuridão deste fato até a próxima edição.
Felizmente vemos que Bruce Wayne, de algum jeito, voltou à sua base em Gotham, e estava em estado catatônico, tendo sido resgatado pelos Pennyworth. Enquanto isso, o inferno pega fogo na cidade com todos os cidadãos já enlouquecidos pela toxina do palhaço. Julia Pennyworth informa que testaram todas as fórmulas que Bruce sintetizou no passado contra várias toxinas do Coringa, mas nenhuma deu certo para resolver a presente crise.
Dessa forma, o morcego vai para o hospital presbiteriano tentar encontrar o "paciente zero", na esperança de conseguir um anticorpo que proverá a cura, e liga para Gordon (fiquem atentos ao ringtone de "I Fought the Law" no celular do tira!). Quando Batman chega lá de asa-delta, o inferno está solto, e o caos está instaurado; Batman luta ferozmente para passar pelas pessoas contaminadas, enquanto Gordon faz uma pesquisa para saber mais sobre a situação atual do hospital, o que achei meio incoerente na história, visto que por ele ser o comissário, deveria saber de cabeça qual a atual situação do lugar. Enfim, mal sabe ele que o Coringa está a espreita.
Assim, Batman e Gordon tem que lidar com duas adversidades que se aproximam de seus passados. O morcego encontra Joe Chill, o assassino de seus pais, pálido e com o sorriso do Coringa, e tem que salvar um garoto de ter seus pais sendo assassinados em um beco da cidade, e Gordon tenta se livrar das garras do Coringa, que também o assombrou no passado. O Coringa ateia fogo na casa de Gordon, e Batman tenta salvar o garoto pulando de uma janela que ele estilhaça. Esta parte simplesmente termina com Batman em seu gancho, e com o garoto em seus braços, voando pela cidade e ligando para ver se Gordon está bem, mas o que ele ouve do outro lado é um "oi, Bruce", e o painel nos mostra um sorriso torpe, sem nos especificar se é o Coringa ou Gordon sob o efeito do gás.
Até aqui a narrativa se ocupou de mostrar as tentativas de Batman em conseguir entender o que realmente fazer e pra onde deveria se dirigir. O final é cheio de suspense, e me deixou bastante curioso até o próximo mês, imaginando quem poderia ser a pessoa que falou com Batman. Eu já apostava no possível fim de Gordon, uma vez que a revista estava tomando rumos bastante bizarros ultimamente. Mas o pior ainda estava por vir. O melhor desse conto macabro realmente vai começar agora, nas três últimas edições.
Na parte quatro, iniciamos diretamente na ação, e Batman salva um menino chamado Duke; indo direto para o apartamento de Gordon, na Praça da Fundação, ele descobre que Gordon acabou sendo contaminado com a substância do Coringa.
Batman tenta pedir ajuda a um perplexo Duke, mas quase é morto, não fosse Julia Pennyworth ter ido socorrê-lo. Ela também informa que a substância causa apodrecimento celular, sendo portanto, mortal.
Julia leva Duke para a base e Batman vai atrás da origem de tudo, ligando para Dick Grayson e pedindo uma análise de amostra de sangue. A coisa parece muito mais feia depois disso, o que leva Batman a pedir uma comparação entre uma amostra de sangue recente com a estrutura do virus. Eles descobrem que o vírus, comparado com o sangue, tem fator degenerativo, enquanto que o segundo, regenerativo. Uma piada de opostos, vida e morte.
Enquanto combate ferozmente a multidão descontrolada, Batman e Dick recolhem fatos sobre o doutor Morte, também conhecido como o cientista Karl Helfern, além de Hugo Strange e Paul Dekker, chamados de Os Três Doutores; um deles aparentemente havia ajudado o Coringa a se infiltrar na Mansão Arkham e conseguir o sangue que o está regenerando. Uma reviravolta bem curiosa, e salpicada por mais um detalhe: Eric Border participou de tudo. Batman tem a informação que precisava, mas não um plano que funcione para resolver a situação desesperadora e apocalíptica.
Então ele se dirige a um laboratório, o laboratório de Paul Dekker. Enquanto filosofa, em off sobre uma sutura que o cientista descobriu e que torna a capacidade das células propícia a se regenerarem, ele encontra o cientista maluco que explica ao morcego sobre sua descoberta, e que três personalidades de Gotham haviam encontrado o composto desde o início dos tempos, citando, indiretamente, Vandal Savage, Ras Al'Ghul e o Coringa. Essa última informação não é detalhadamente trabalhada, é só para estabelecer a possibilidade de o Coringa existir desde o início da humanidade, e nós nunca termos percebido isso.
Dekker havia sintetizado a fórmula e a chamou de "Dionisium", numa irônica referência ao deus grego vindo da coxa de Zeus. Enquanto tenta acertar Batman com sua metralhadora, Dekker recebe um contra-ataque surpresa do morcego e, dependurado na janela, revela a Batman que a fórmula vem do próprio Coringa, e que o doutor apenas inventou substâncias curativas momentâneas. Tanto o vírus quanto a cura estão no palhaço, que o doutor chama de "homem dionísico". O Coringa é Dionísio, deus da insanidade, e Gotham é a oferenda para o sacrifício.
Ainda com Dekker, Batman contacta Julia e descobre que tem menos de 24 horas para fazer alguma coisa. Julia também analisa imagens históricas de Gotham e, analisando rostos, vê que Coringa está em todos os lugares, e em todas as épocas. Dekker se aplica o virus e parece derreter, e o morcego se vê sem saída, ainda tentando processar o fato de que o Coringa, de alguma forma esteve envolvido em fatos importantes na história de Gotham. Batman não vê alternativa a não ser contactar a Corte das Corujas. Isso mesmo! A mesma Corte que tentou aniquilar o morcego. A tensão aumenta e o entusiasmo pela próxima edição também.
Então as coisas ficam cada vez mais insanas. A narrativa já nos joga direto para Batman peitando a Corte das Corujas e pedindo informações sobre o Coringa. As coisas não vão muito bem e o morcego decide dar as costas e partir, mas é abordado por um Garra que simplesmente sai das águas do esgoto e o ataca. Ele consegue se livrar do Garra, e assim que sai dos esgotos, contacta Julia e diz que não havia encontrado a fórmula do Dionisium.
As coisas em Gotham não param de piorar. Enquanto isso, o Coringa invade a caverna subterrânea do morcego para surpreender Alfred, o distraindo com uma história de teatro (lembre-se do Gotham Royal do início), enquanto o mordomo pega uma escopeta para se defender. O Coringa então amputa a mão direita de Alfred, o colocando a sua mercê. O Coringa volta à cidade para instigar Batman a extrair o Dionisium de sua coluna vertebral. A linha do tempo alterna para algumas horas atrás e o momento presente, pra explicar alguns trechos do elaborado plano que Batman tem de extrair a substância. Vilões como Crocodilo, Pinguim, Espantalho, Hera, Bane, Senhor Frio e Cara de Barro tem um trato entre si de velar o morcego, mas o Batman, em uma arriscadíssima manobra, pretende se aliar com esses vilões e sua equipe, para deter a ameaça do Coringa. Uma reviravolta no mínimo interessante. Batman explica a urgência de se unirem em prol de uma causa em comum, preservar a cidade, e a história pára mais uma vez, com a aterrorizante face do Coringa pronto para agir.
Finalmente, na edição final deste arco, iniciamos com uma narração de Batman relembrando o evento chave que fez com que o Capuz Vermelho se tornasse o Coringa. Imediatamente somos jogados para a sequência, para todo o confronto que está havendo em Gotham, entre os cidadãos afetados pela toxina do Coringa e Batman e seus aliados nesta batalha, incluindo os vilões citados anteriormente, todos com máscaras de gás, para evitar o contato com a toxina.
Após um esforço épico, Batman consegue agarrar o Coringa para extrair o líquido de sua coluna, mas 140 decibéis de risos acabam frustrando a tentativa e destruindo as máscaras no processo. Batman havia usado um anulador contra a toxina, o que deverá deixar ele e seus aliados bem, mas o Coringa diz que o Dionisium não está no corpo dele, mas em um lugar embaixo de Gotham, numa caverna, em um poço. A propósito, quem se lembra de Death of the Family, sabe que o palhaço conhece a verdadeira identidade de Batman aqui nos Novos 52. O Coringa está pronto para matar o morcego, mas ele é tapeado, porque quem está com a roupa de Batman é Dick Grayson, e Bruce já está se dirigindo para a caverna com o Dionisium, contando com a ajuda de Julia.
Preocupada com o morcego, Julia mantém contato enquanto Batman coleta amostras do Dionisium. Só que uma explosão erode a caverna e o Coringa aparece. Os dois travam a última batalha. Batman recebe dois punhais nas costas e três cartas de baralho, sendo que uma atinge seu olho esquerdo, cegando-o, espelhando o que houve com o Coringa de Frank Miller. O embate fica cada vez mais brutal, violento e sanguinário, até que numa tentativa de finalmente matar o morcego com o último de seus punhais... Batman reage e tem uma estarrecedora revelação, segurando o Coringa o quanto pode, para que ele não chegue até a poça de Dionisium. Após isso, os dois, mortalmente feridos, são soterrados nos escombros da caverna, enquanto Julia recolhe a amostra que Batman colheu da poça, minutos atrás.
Este último embate dos dois antagonistas foi simplesmente sensacional! Scott Snyder é um escritor inacreditável, que sabe criar tensão e drama como poucos. O suposto momento final entre os dois antagonistas é pontuado de drama, desespero e muita tensão, e quando a gente passa para a próxima página, o impulso imediato é voltar algumas e ler tudo outra vez, já sem fôlego. Vemos realmente um embate de proporções épicas, Hades contra Loki.
As sequências finais mostram Julia e Alfred na mansão Wayne, se lamentando, duas semanas depois, de todo o ocorrido e conversando sobre uma última mensagem que Bruce havia deixado: HAH. Quem novamente leu Death of the Family, se lembra que essa é a mensagem final do Coringa para Batman. Alfred explica a Julia: o Coringa havia tentado Batman de todas as formas com um final feliz; mas para Batman, sua história será sempre uma história trágica, de superação e resiliência, nunca de transcendência. É desta forma que Snyder e Cappulo fecham uma das bat-narrativas mais extraordinárias que eu já tive o prazer de ler.
E a ilustração final que a fecha é justamente um peitoral de armadura medieval em uma lata de lixo, simbolizando a teatralidade e conectando com a introdução que vimos da narrativa, mostrando o Gotham Royal. Achei demais este simbolismo. O Coringa sempre foi um menestrel, e Batman sempre se usou da teatralidade e ilusão como forma de intimidação. O simbolismo nos leva àquela ideia do teatro, onde sempre existiram, desde a Grécia antiga, dois antagonistas em uma batalha; isso nos leva novamente aos personagens da mitologia grega que encompassam diversas dessas narrativas épicas, e claro, destaca mais uma vez a dicotomia que existe entre dois sujeitos igualmente loucos, mas em lados diferentes.
Houve também, em cada edição do arco Endgame, exceto na última, uma narrativa paralela bem interessante, que busca resolver a questão das origens do Coringa. Ok, primeiramente as más notícias: não resolve. Em todas as narrativas curtas, o que se tem são histórias que nunca chegam ao âmbito da certeza documental, mas sim da visão pessoal que cada personagem tem sobre o palhaço do crime; estas histórias são apenas para acender a chama da curiosidade no leitor, mas em essência, cada personagem conta uma coisa diferente, tem um inclusive que acha que o Coringa é um androide!
Enfim, tratam-se apenas de histórias complementares que auxiliam a gente a transitar da narrativa de Snyder e Cappulo para as histórias que estavam sendo contadas no título Arkham Mansion, e confirmam algumas suspeitas que se possa ter na narração principal de Endgame.
Como a primeira delas, cujo título é The Pale Man (O Homem Pálido), onde residentes do Condado Kane refletem sobre o Coringa e sua possível origem. A sensação claustrofóbica provocada pela narrativa e pela neurose dos personagens (a história se passa dentro de um mesmo ambiente, como as histórias antigas de detetive) é bem interessante. Temos uma enfermeira e pacientes da Mansão Arkham, todos falando sobre o Coringa, porque todos eles foram visitados pelo palhaço, segundo relatos. Um deles, um sujeito esguio, conta como foi o primeiro encontro dele com o palhaço, e conta que o Coringa se trata de uma criatura demoníaca, e eterna, que está aqui entre nós já faz muito tempo, séculos. Balela? Talvez. Mas você tem que ler, é uma narrativa intrigante.
Em outra edição, temos o curto conto Saved (Salvo), que conta a triste história de uma mulher que teve seu marido e seus filhos, cada dia mais e mais afundados na loucura, enquanto eram consumidos pela toxina do Coringa. Então chega uma hora que ela, não aguentando mais, esfaqueia toda sua família. Sim, é bizarro assim mesmo. E fica mais bizarro ainda. Ela dá a entender que ela teve a visita de um Coringa androide, ou algo do tipo. Enfim, a doutora que estava na Mansão Arkham, na história da edição anterior ouve toda a história e descobre que todos os detentos foram contaminados pela toxina do palhaço. Não fica muito claro o que aconteceu com a doutora, mas os detentos estão livres e prontos para aprontar o inferno pela cidade. Uma narrativa curta, porém com uma ideia aterradora.
A próxima história curta se chama The First Laugh (A Primeira Gargalhada). Fiquei pensando se essa era uma alusão à graphic novel Joker's Last Laugh, de 2001, ou então à um episódio de Batman: The Animated Series chamado The Last Laugh (A Última Gargalhada), em que o Coringa envenena Gotham com fumaça de seu gás do riso, fazendo todos os cidadãos darem gargalhadas. Ela inicia com a Dra. Zaheer e Morton, um interno que quer descobrir a verdade sobre o palhaço, e que quando estava na escola adorava fazer o pessoal rir, porque Gotham sempre foi um lugar muito acinzentado e triste, e conta como um palhaço com sorriso macabro veio um dia para um grupo de empresários e disse que poderia fazer o povo rir, e assim foi. Mas ele fazia as pessoas rirem tanto, que chegavam a cuspir sangue, e mais estranho ainda, ele parecia mesmo imortal em meio a todo caos. A história assustou tanto Morton que ele nunca mais quis fazer as pessoas rirem de novo, e tentou avisar a todos que se rissem, iriam morrer. Eis que o Coringa em pessoa aparece para ele e a doutora, e os captura, dizendo que iriam se ver em breve. Meio exagerada e sobrenatural a narrativa, mas foi uma experiência bacana, e com a ótima arte gráfica de John McCrea.
A próxima, Heart (Coração), mostra que a doutora Zaheer está tentando conter os pacientes que a sequestraram, mas um deles, Cassidy, acredita que viu um sinal do Coringa e espera conhecer a verdade. É a narrativa mais bisonha desse arco, e o traço de Sam Kieth, só colabora para toda a bizarrice. Gosto de Kieth nas histórias do Sandman, mas quando desenha Batman, aí eu já não curto muito não. Enfim, ele conta de seu período entre os militares e diz à doutora que ele e mais alguns estavam sendo preparados e testados para serem Batmans, após ele ver um batarangue em meio a areia, então ele invade um computador e descobre todo o plano, sendo enxotado dos militares. Ele se veste de Batman para provar que poderia ser um deles, bate em um cara até morrer, e é colocado no Arkham, e lá ele recebe a visita do Coringa, que revela a Cassidy que o batarangue que ele achou na verdade era do palhaço. O Coringa diz a ele que há um coração, uma base de Batmans, embaixo da cidade, e é pra lá que o palhaço quer que Cassidy vá. Aos protestos da doutora Zaheer, Cassidy e os outros internos se dirigem em direção a um lugar contendo uma pintura de grafite de um coração, e a narrativa pára. Interessante, mas achei a narrativa menos efetiva de todo o arco, e especialmente de todas essas histórias complementares.
A última, The Last Smile (O Último Sorriso), mostra novamente a doutora Zaheer, mas desta vez é ela que conta uma história possível de origem do palhaço do crime. Mas, como nós já esperávamos, ela é uma lorota, como todas as outras que a doutora ouviu de seus pacientes; em outras palavras, o Coringa riu por último, como acusa o título. Para piorar as coisas, ela descobre que seu amigo Eric Border era o Coringa, e até ele inventou a história que a doutora achava ser a verdadeira e que publicou em seu livro. No fim, o Coringa dá uma escolha à pobre doutora... e cinco balas em um tambor de uma pistola. É onde tudo termina.
Fazia muito tempo que eu não ficava deslumbrado, sem reação, absolutamente sem fala e tenso até o último momento com um embate tão bacana entre o morcego e o palhaço. Ao terminar de ler, fechei a última edição, coloquei ela no colo admirando aquela capa e pensei comigo: "esta poderia ser a história final de Batman!" Porque Batman é exatamente isso: tragédia, sombras, a luta de um homem contra a insanidade e todo seu esforço em não cruzar a linha que pode tornar-lhe igual aos que combate. O drama do teatro está aqui, neste personagem operístico, e que Scott Snyder e Greg Cappulo trabalharam tão bem em sua gestão, durante os Novos 52.
Endgame, embora o título esteja implicando em um suposto fim de linha, não é o final de tudo, como eu disse antes, Batman e Coringa não ficarão fora de circulação para sempre, mas com certeza foi um fecho de arco sensacional, que merece todo nosso respeito e que eu recomendo imensamente, com todos os méritos. A luta entre o bem e o mal, essa é eterna, como o próprio teatro de ópera nos mostra, e sempre existirão tipos como Batman e Coringa, nas mais diversas formas e interpretações, para nos lembrar dessa clássica visão preta e branca a qual nos inspiramos desde os tempos do teatro grego.
O arco de histórias foi publicado originalmente em seis partes, nos números #35 a #40 da revista mensal do Batman, nas edições originais americanas. Aqui no Brasil, a Panini pulou a edição #38 para dar mais ênfase ao título Arkham Mansion, ficando então a ordem brasileira diferente, sendo as edições nº 35, 36, 37, 39, 40 e 41. É bom esclarecer isso para quem for querer ir atrás do arco publicado por aqui. Outra coisa: conforme nos é informado na HQ, os eventos aqui apresentados acontecem após a série semanal Batman: Eternal, que durou 52 edições; eu não acompanhei essa série, então não posso opinar sobre ela. Se um dia eu vier a lê-la em formato encadernado, talvez fale alguma coisa, mas no momento, meu conhecimento se resume ao que eu narrar aqui nestas revistas mensais que eu acompanhei melhor.
A história se inicia nos mostrando a figura de um teatro, o Gotham Royal, e depois somos jogados direto na ação, onde vemos um grande perigo tomando Gotham de assalto, com Batman e seus aliados lutando contra isso, onde Batman aparentemente "morre". Na próxima sequência vemos que era um sonho, e vemos Alfred e sua... filha (???) Julia Pennyworth (isso que dá perder algumas edições da revista) com Bruce em uma espécie de quartel general, do alto de um prédio, no meio da cidade de Gotham.
Bruce está se recuperando de ferimentos (que eu suponho que sejam resultado de Batman: Eternal) e do efeito do gás do Espantalho, o que explica o sonho, quando de repente, a Mulher Maravilha arrebenta a janela e invade a base, agarrando Wayne e dizendo que veio para matá-lo. Isso tudo, segundo a narração, aconteceu a 29 minutos atrás. Corta para "agora", como nos é informado, e Batman tenta neutralizar Diana dentro de um mecha robô, quando o Flash aparece também com intenção de matar o morcego. Depois Aquaman; por fim, o Superman. Todos eles, por alguma razão, querendo tirar a vida de Bruce. Julia Pennyworth faz aqui o papel de "Oráculo", tentando ajudar, como pode, o Batman através da base de operações na torre. Exceto por Superman, Batman consegue neutralizar todos os outros heróis, e vemos, no final desta edição, o Super e os outros, exibindo sorrisos parecidos com o do Coringa.
Fiquei impressionado com esses desdobramentos quando li, o Snyder parece saber muito bem o que faz.
Na sequência, vemos o morcego aparentemente sofrer mais algumas ilusões, e continuar a receber os ataques de Superman, que está sob os efeitos de alguma toxina que o Coringa aparentemente deixou. Deu um mega trabalho, mas Batman consegue, de alguma maneira, deter o azulão com truque de sóis vermelhos e até mesmo um cuspezinho no olho de Superman contendo poeira de kriptonita. Não me pergunte, ele é o Batman! Feito isso, ele hospitaliza toda a Liga para se livrarem dos efeitos, e retorna para a sua base no meio da cidade. Bruce e Alfred tem uma discussãozinha, mas obcecado e determinado como sabemos que é, Bruce acaba vencendo a discussão e diz para Alfred e Julia irem para um lugar seguro.
Batman retorna aos escombros do abandonado Asilo Arkham para ver Eric Border e tentar descobrir alguma pista do paradeiro do Coringa. Acaba que, inocentemente, Batman entra em uma das celas enquanto fala com Border, mas Border é na verdade o Coringa disfarçado, e aprisiona o morcego. O Coringa provoca Batman, enquanto relata que todo o povo de Gotham está indo a loucura com a sua toxina, a mesma que transforma as pessoas em "Coringas", que as fazem perder a cabeça e agir segundo a personalidade insana do palhaço. A edição termina com o Coringa puxando uma arma e apontando para a cabeça do morcego, fazendo que vai matá-lo; ficamos na escuridão deste fato até a próxima edição.
Felizmente vemos que Bruce Wayne, de algum jeito, voltou à sua base em Gotham, e estava em estado catatônico, tendo sido resgatado pelos Pennyworth. Enquanto isso, o inferno pega fogo na cidade com todos os cidadãos já enlouquecidos pela toxina do palhaço. Julia Pennyworth informa que testaram todas as fórmulas que Bruce sintetizou no passado contra várias toxinas do Coringa, mas nenhuma deu certo para resolver a presente crise.
Dessa forma, o morcego vai para o hospital presbiteriano tentar encontrar o "paciente zero", na esperança de conseguir um anticorpo que proverá a cura, e liga para Gordon (fiquem atentos ao ringtone de "I Fought the Law" no celular do tira!). Quando Batman chega lá de asa-delta, o inferno está solto, e o caos está instaurado; Batman luta ferozmente para passar pelas pessoas contaminadas, enquanto Gordon faz uma pesquisa para saber mais sobre a situação atual do hospital, o que achei meio incoerente na história, visto que por ele ser o comissário, deveria saber de cabeça qual a atual situação do lugar. Enfim, mal sabe ele que o Coringa está a espreita.
Assim, Batman e Gordon tem que lidar com duas adversidades que se aproximam de seus passados. O morcego encontra Joe Chill, o assassino de seus pais, pálido e com o sorriso do Coringa, e tem que salvar um garoto de ter seus pais sendo assassinados em um beco da cidade, e Gordon tenta se livrar das garras do Coringa, que também o assombrou no passado. O Coringa ateia fogo na casa de Gordon, e Batman tenta salvar o garoto pulando de uma janela que ele estilhaça. Esta parte simplesmente termina com Batman em seu gancho, e com o garoto em seus braços, voando pela cidade e ligando para ver se Gordon está bem, mas o que ele ouve do outro lado é um "oi, Bruce", e o painel nos mostra um sorriso torpe, sem nos especificar se é o Coringa ou Gordon sob o efeito do gás.
Até aqui a narrativa se ocupou de mostrar as tentativas de Batman em conseguir entender o que realmente fazer e pra onde deveria se dirigir. O final é cheio de suspense, e me deixou bastante curioso até o próximo mês, imaginando quem poderia ser a pessoa que falou com Batman. Eu já apostava no possível fim de Gordon, uma vez que a revista estava tomando rumos bastante bizarros ultimamente. Mas o pior ainda estava por vir. O melhor desse conto macabro realmente vai começar agora, nas três últimas edições.
Na parte quatro, iniciamos diretamente na ação, e Batman salva um menino chamado Duke; indo direto para o apartamento de Gordon, na Praça da Fundação, ele descobre que Gordon acabou sendo contaminado com a substância do Coringa.
Batman tenta pedir ajuda a um perplexo Duke, mas quase é morto, não fosse Julia Pennyworth ter ido socorrê-lo. Ela também informa que a substância causa apodrecimento celular, sendo portanto, mortal.
Julia leva Duke para a base e Batman vai atrás da origem de tudo, ligando para Dick Grayson e pedindo uma análise de amostra de sangue. A coisa parece muito mais feia depois disso, o que leva Batman a pedir uma comparação entre uma amostra de sangue recente com a estrutura do virus. Eles descobrem que o vírus, comparado com o sangue, tem fator degenerativo, enquanto que o segundo, regenerativo. Uma piada de opostos, vida e morte.
Enquanto combate ferozmente a multidão descontrolada, Batman e Dick recolhem fatos sobre o doutor Morte, também conhecido como o cientista Karl Helfern, além de Hugo Strange e Paul Dekker, chamados de Os Três Doutores; um deles aparentemente havia ajudado o Coringa a se infiltrar na Mansão Arkham e conseguir o sangue que o está regenerando. Uma reviravolta bem curiosa, e salpicada por mais um detalhe: Eric Border participou de tudo. Batman tem a informação que precisava, mas não um plano que funcione para resolver a situação desesperadora e apocalíptica.
Então ele se dirige a um laboratório, o laboratório de Paul Dekker. Enquanto filosofa, em off sobre uma sutura que o cientista descobriu e que torna a capacidade das células propícia a se regenerarem, ele encontra o cientista maluco que explica ao morcego sobre sua descoberta, e que três personalidades de Gotham haviam encontrado o composto desde o início dos tempos, citando, indiretamente, Vandal Savage, Ras Al'Ghul e o Coringa. Essa última informação não é detalhadamente trabalhada, é só para estabelecer a possibilidade de o Coringa existir desde o início da humanidade, e nós nunca termos percebido isso.
Dekker havia sintetizado a fórmula e a chamou de "Dionisium", numa irônica referência ao deus grego vindo da coxa de Zeus. Enquanto tenta acertar Batman com sua metralhadora, Dekker recebe um contra-ataque surpresa do morcego e, dependurado na janela, revela a Batman que a fórmula vem do próprio Coringa, e que o doutor apenas inventou substâncias curativas momentâneas. Tanto o vírus quanto a cura estão no palhaço, que o doutor chama de "homem dionísico". O Coringa é Dionísio, deus da insanidade, e Gotham é a oferenda para o sacrifício.
Ainda com Dekker, Batman contacta Julia e descobre que tem menos de 24 horas para fazer alguma coisa. Julia também analisa imagens históricas de Gotham e, analisando rostos, vê que Coringa está em todos os lugares, e em todas as épocas. Dekker se aplica o virus e parece derreter, e o morcego se vê sem saída, ainda tentando processar o fato de que o Coringa, de alguma forma esteve envolvido em fatos importantes na história de Gotham. Batman não vê alternativa a não ser contactar a Corte das Corujas. Isso mesmo! A mesma Corte que tentou aniquilar o morcego. A tensão aumenta e o entusiasmo pela próxima edição também.
Então as coisas ficam cada vez mais insanas. A narrativa já nos joga direto para Batman peitando a Corte das Corujas e pedindo informações sobre o Coringa. As coisas não vão muito bem e o morcego decide dar as costas e partir, mas é abordado por um Garra que simplesmente sai das águas do esgoto e o ataca. Ele consegue se livrar do Garra, e assim que sai dos esgotos, contacta Julia e diz que não havia encontrado a fórmula do Dionisium.
As coisas em Gotham não param de piorar. Enquanto isso, o Coringa invade a caverna subterrânea do morcego para surpreender Alfred, o distraindo com uma história de teatro (lembre-se do Gotham Royal do início), enquanto o mordomo pega uma escopeta para se defender. O Coringa então amputa a mão direita de Alfred, o colocando a sua mercê. O Coringa volta à cidade para instigar Batman a extrair o Dionisium de sua coluna vertebral. A linha do tempo alterna para algumas horas atrás e o momento presente, pra explicar alguns trechos do elaborado plano que Batman tem de extrair a substância. Vilões como Crocodilo, Pinguim, Espantalho, Hera, Bane, Senhor Frio e Cara de Barro tem um trato entre si de velar o morcego, mas o Batman, em uma arriscadíssima manobra, pretende se aliar com esses vilões e sua equipe, para deter a ameaça do Coringa. Uma reviravolta no mínimo interessante. Batman explica a urgência de se unirem em prol de uma causa em comum, preservar a cidade, e a história pára mais uma vez, com a aterrorizante face do Coringa pronto para agir.
Finalmente, na edição final deste arco, iniciamos com uma narração de Batman relembrando o evento chave que fez com que o Capuz Vermelho se tornasse o Coringa. Imediatamente somos jogados para a sequência, para todo o confronto que está havendo em Gotham, entre os cidadãos afetados pela toxina do Coringa e Batman e seus aliados nesta batalha, incluindo os vilões citados anteriormente, todos com máscaras de gás, para evitar o contato com a toxina.
Após um esforço épico, Batman consegue agarrar o Coringa para extrair o líquido de sua coluna, mas 140 decibéis de risos acabam frustrando a tentativa e destruindo as máscaras no processo. Batman havia usado um anulador contra a toxina, o que deverá deixar ele e seus aliados bem, mas o Coringa diz que o Dionisium não está no corpo dele, mas em um lugar embaixo de Gotham, numa caverna, em um poço. A propósito, quem se lembra de Death of the Family, sabe que o palhaço conhece a verdadeira identidade de Batman aqui nos Novos 52. O Coringa está pronto para matar o morcego, mas ele é tapeado, porque quem está com a roupa de Batman é Dick Grayson, e Bruce já está se dirigindo para a caverna com o Dionisium, contando com a ajuda de Julia.
Preocupada com o morcego, Julia mantém contato enquanto Batman coleta amostras do Dionisium. Só que uma explosão erode a caverna e o Coringa aparece. Os dois travam a última batalha. Batman recebe dois punhais nas costas e três cartas de baralho, sendo que uma atinge seu olho esquerdo, cegando-o, espelhando o que houve com o Coringa de Frank Miller. O embate fica cada vez mais brutal, violento e sanguinário, até que numa tentativa de finalmente matar o morcego com o último de seus punhais... Batman reage e tem uma estarrecedora revelação, segurando o Coringa o quanto pode, para que ele não chegue até a poça de Dionisium. Após isso, os dois, mortalmente feridos, são soterrados nos escombros da caverna, enquanto Julia recolhe a amostra que Batman colheu da poça, minutos atrás.
Este último embate dos dois antagonistas foi simplesmente sensacional! Scott Snyder é um escritor inacreditável, que sabe criar tensão e drama como poucos. O suposto momento final entre os dois antagonistas é pontuado de drama, desespero e muita tensão, e quando a gente passa para a próxima página, o impulso imediato é voltar algumas e ler tudo outra vez, já sem fôlego. Vemos realmente um embate de proporções épicas, Hades contra Loki.
As sequências finais mostram Julia e Alfred na mansão Wayne, se lamentando, duas semanas depois, de todo o ocorrido e conversando sobre uma última mensagem que Bruce havia deixado: HAH. Quem novamente leu Death of the Family, se lembra que essa é a mensagem final do Coringa para Batman. Alfred explica a Julia: o Coringa havia tentado Batman de todas as formas com um final feliz; mas para Batman, sua história será sempre uma história trágica, de superação e resiliência, nunca de transcendência. É desta forma que Snyder e Cappulo fecham uma das bat-narrativas mais extraordinárias que eu já tive o prazer de ler.
E a ilustração final que a fecha é justamente um peitoral de armadura medieval em uma lata de lixo, simbolizando a teatralidade e conectando com a introdução que vimos da narrativa, mostrando o Gotham Royal. Achei demais este simbolismo. O Coringa sempre foi um menestrel, e Batman sempre se usou da teatralidade e ilusão como forma de intimidação. O simbolismo nos leva àquela ideia do teatro, onde sempre existiram, desde a Grécia antiga, dois antagonistas em uma batalha; isso nos leva novamente aos personagens da mitologia grega que encompassam diversas dessas narrativas épicas, e claro, destaca mais uma vez a dicotomia que existe entre dois sujeitos igualmente loucos, mas em lados diferentes.
Houve também, em cada edição do arco Endgame, exceto na última, uma narrativa paralela bem interessante, que busca resolver a questão das origens do Coringa. Ok, primeiramente as más notícias: não resolve. Em todas as narrativas curtas, o que se tem são histórias que nunca chegam ao âmbito da certeza documental, mas sim da visão pessoal que cada personagem tem sobre o palhaço do crime; estas histórias são apenas para acender a chama da curiosidade no leitor, mas em essência, cada personagem conta uma coisa diferente, tem um inclusive que acha que o Coringa é um androide!
Enfim, tratam-se apenas de histórias complementares que auxiliam a gente a transitar da narrativa de Snyder e Cappulo para as histórias que estavam sendo contadas no título Arkham Mansion, e confirmam algumas suspeitas que se possa ter na narração principal de Endgame.
Como a primeira delas, cujo título é The Pale Man (O Homem Pálido), onde residentes do Condado Kane refletem sobre o Coringa e sua possível origem. A sensação claustrofóbica provocada pela narrativa e pela neurose dos personagens (a história se passa dentro de um mesmo ambiente, como as histórias antigas de detetive) é bem interessante. Temos uma enfermeira e pacientes da Mansão Arkham, todos falando sobre o Coringa, porque todos eles foram visitados pelo palhaço, segundo relatos. Um deles, um sujeito esguio, conta como foi o primeiro encontro dele com o palhaço, e conta que o Coringa se trata de uma criatura demoníaca, e eterna, que está aqui entre nós já faz muito tempo, séculos. Balela? Talvez. Mas você tem que ler, é uma narrativa intrigante.
Em outra edição, temos o curto conto Saved (Salvo), que conta a triste história de uma mulher que teve seu marido e seus filhos, cada dia mais e mais afundados na loucura, enquanto eram consumidos pela toxina do Coringa. Então chega uma hora que ela, não aguentando mais, esfaqueia toda sua família. Sim, é bizarro assim mesmo. E fica mais bizarro ainda. Ela dá a entender que ela teve a visita de um Coringa androide, ou algo do tipo. Enfim, a doutora que estava na Mansão Arkham, na história da edição anterior ouve toda a história e descobre que todos os detentos foram contaminados pela toxina do palhaço. Não fica muito claro o que aconteceu com a doutora, mas os detentos estão livres e prontos para aprontar o inferno pela cidade. Uma narrativa curta, porém com uma ideia aterradora.
A próxima história curta se chama The First Laugh (A Primeira Gargalhada). Fiquei pensando se essa era uma alusão à graphic novel Joker's Last Laugh, de 2001, ou então à um episódio de Batman: The Animated Series chamado The Last Laugh (A Última Gargalhada), em que o Coringa envenena Gotham com fumaça de seu gás do riso, fazendo todos os cidadãos darem gargalhadas. Ela inicia com a Dra. Zaheer e Morton, um interno que quer descobrir a verdade sobre o palhaço, e que quando estava na escola adorava fazer o pessoal rir, porque Gotham sempre foi um lugar muito acinzentado e triste, e conta como um palhaço com sorriso macabro veio um dia para um grupo de empresários e disse que poderia fazer o povo rir, e assim foi. Mas ele fazia as pessoas rirem tanto, que chegavam a cuspir sangue, e mais estranho ainda, ele parecia mesmo imortal em meio a todo caos. A história assustou tanto Morton que ele nunca mais quis fazer as pessoas rirem de novo, e tentou avisar a todos que se rissem, iriam morrer. Eis que o Coringa em pessoa aparece para ele e a doutora, e os captura, dizendo que iriam se ver em breve. Meio exagerada e sobrenatural a narrativa, mas foi uma experiência bacana, e com a ótima arte gráfica de John McCrea.
A próxima, Heart (Coração), mostra que a doutora Zaheer está tentando conter os pacientes que a sequestraram, mas um deles, Cassidy, acredita que viu um sinal do Coringa e espera conhecer a verdade. É a narrativa mais bisonha desse arco, e o traço de Sam Kieth, só colabora para toda a bizarrice. Gosto de Kieth nas histórias do Sandman, mas quando desenha Batman, aí eu já não curto muito não. Enfim, ele conta de seu período entre os militares e diz à doutora que ele e mais alguns estavam sendo preparados e testados para serem Batmans, após ele ver um batarangue em meio a areia, então ele invade um computador e descobre todo o plano, sendo enxotado dos militares. Ele se veste de Batman para provar que poderia ser um deles, bate em um cara até morrer, e é colocado no Arkham, e lá ele recebe a visita do Coringa, que revela a Cassidy que o batarangue que ele achou na verdade era do palhaço. O Coringa diz a ele que há um coração, uma base de Batmans, embaixo da cidade, e é pra lá que o palhaço quer que Cassidy vá. Aos protestos da doutora Zaheer, Cassidy e os outros internos se dirigem em direção a um lugar contendo uma pintura de grafite de um coração, e a narrativa pára. Interessante, mas achei a narrativa menos efetiva de todo o arco, e especialmente de todas essas histórias complementares.
A última, The Last Smile (O Último Sorriso), mostra novamente a doutora Zaheer, mas desta vez é ela que conta uma história possível de origem do palhaço do crime. Mas, como nós já esperávamos, ela é uma lorota, como todas as outras que a doutora ouviu de seus pacientes; em outras palavras, o Coringa riu por último, como acusa o título. Para piorar as coisas, ela descobre que seu amigo Eric Border era o Coringa, e até ele inventou a história que a doutora achava ser a verdadeira e que publicou em seu livro. No fim, o Coringa dá uma escolha à pobre doutora... e cinco balas em um tambor de uma pistola. É onde tudo termina.
Fazia muito tempo que eu não ficava deslumbrado, sem reação, absolutamente sem fala e tenso até o último momento com um embate tão bacana entre o morcego e o palhaço. Ao terminar de ler, fechei a última edição, coloquei ela no colo admirando aquela capa e pensei comigo: "esta poderia ser a história final de Batman!" Porque Batman é exatamente isso: tragédia, sombras, a luta de um homem contra a insanidade e todo seu esforço em não cruzar a linha que pode tornar-lhe igual aos que combate. O drama do teatro está aqui, neste personagem operístico, e que Scott Snyder e Greg Cappulo trabalharam tão bem em sua gestão, durante os Novos 52.
Endgame, embora o título esteja implicando em um suposto fim de linha, não é o final de tudo, como eu disse antes, Batman e Coringa não ficarão fora de circulação para sempre, mas com certeza foi um fecho de arco sensacional, que merece todo nosso respeito e que eu recomendo imensamente, com todos os méritos. A luta entre o bem e o mal, essa é eterna, como o próprio teatro de ópera nos mostra, e sempre existirão tipos como Batman e Coringa, nas mais diversas formas e interpretações, para nos lembrar dessa clássica visão preta e branca a qual nos inspiramos desde os tempos do teatro grego.
Batman: Endgame (Dezembro/2014 a Junho/2015)
Título em português BR: Batman: Fim de Jogo
Arco de histórias envolvendo as edições de: Batman (#35-40)
Linha: The New 52
Arco de histórias envolvendo as edições de: Batman (#35-40)
Linha: The New 52
Editora: DC Comics
Formato: Arco - revista mensal
Roteiros: Scott Snyder / James Tynion IV
Desenhistas: Greg Cappulo / Kelley Jones, Graham Nolan, John McCrea, Sam Kieth, Dustin Nguyen
Colorista: FCO Plascencia / Michelle Madsen, Gregory Wright, Ronda Pattison, Dave McCaig
Letrista: Steve Wands, Dezi Sienty, Taylor Esposito, Jared K. Fletcher
Editores: Mark Doyle, Matt Humphreys
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