Friday, February 5, 2016

NO CINEMA: The Revenant (O Regresso)

Nota: 10 / 10

Pouco a pouco, Alejandro González Iñárritu está conquistando lugar especial entre os melhores diretores da atualidade na minha lista pessoal. Em 2014, o cara lançou uma obra totalmente urbana e surrealista, Birdman. O diretor mexicano retorna em 2015 agora com o oposto disso, uma obra calcada totalmente no ambiente selvagem; e deste ambiente selvagem ele tira de talentos como Leonardo DiCaprio e Tom Hardy performances avassaladoras e chocantes.

Em meio à solidão, à neve, à frieza do ambiente selvagem e ao bruto estado da psique humana, uma luz, um espírito incansável perambula pelas montanhas geladas, em busca de retribuição. A frase que permeia a narrativa, "a vingança está nas mãos de Deus" levará Hugh Glass, personagem de DiCaprio, a uma difícil e sofrida jornada.

O título original do filme, é um termo que quer dizer "aquele que retorna após uma longa ausência, após ser dado como morto; espírito". A trama, baseada em partes na novela de Michael Punke e em fatos reais, narra a história de um caçador, Glass, que ajuda um grupo a se safar das garras dos índios Arikara, na primeira metade do séc. XIX, pois ele tem um vasto conhecimento da área onde essas pessoas foram atacadas. Ele tem um filho, Hawk (Forrest Goodluck), e sua esposa havia morrido algum tempo atrás.

Acontece que, um dia, em meio a floresta, Glass é emboscado por um urso e quase morto. Ele luta bravamente, mas não consegue evitar de ser dilacerado pelo animal, que o deixa em estado deplorável, mal sequer conseguindo falar ou se mexer. Alguns de seus homens de confiança, como John Fitzgerald (Tom Hardy), Hawk e Bridger (Will Poulter) o encontraram e se propuseram a ajudar o ferido, mas no meio do caminho, Fitzgerald, em seu imenso egoísmo, tem um chilique e diz a Glass que o pobre homem os estava atrasando para sair da pista dos Arikara e chegar ao forte, o que o faz tentar convencer Glass a deixar Fitzgerald matá-lo, com o pretexto de salvar o filho e o resto dos homens. Hawk vê isso e intervém, fazendo com que Fitzgerald o mate e desperte a ira de Glass, que no momento nada pode fazer.

Convencendo a seus homens que Glass já estava morto, Fitzgerald e eles saem da região e voltam para o forte. O traíra tenta de tudo para encobrir que matou um inocente e tentou matar Glass, durante este tempo. Enquanto isso, acompanhamos o nosso pobre protagonista a se arrastar pelo caminho e tentar sobreviver ao ambiente selvagem e gelado, enquanto procura meios de se recuperar dos ferimentos, tudo isso movido pelo desejo de vingança.

A narrativa ilustra, em toda sua dimensão, a sensação de abandono e perda do protagonista. Curioso até, que seu sobrenome seja Glass ("vidro", em inglês); ironia do destino, um vidro inquebrantável e resistente, que sobrevive às intempéries dos lugares onde passa e continua sua jornada com uma força que só Deus sabe de onde ele conseguiu tirar. Vendo essas peripécias do personagem, me lembrou bastante aqueles programas de sobrevivência que costumam passar no Discovery Channel; eu não assisto TV, mas de vez em quando eu pego esses programas na casa de meu sogro, e vendo tudo isso no filme, esses reality shows foram umas das primeiras coisas que me vieram à cabeça.

A sensação de frieza, indiferença e isolamento é traduzida em toda magnitude do ambiente cheio de neve, gelado e bruto como o coração daquele que o abandonou à própria sorte. Uma das cenas mais desconcertantes, é quando vemos Glass dilacerar um alce, removendo toda sua carne de dentro, abrindo espaço para que pudesse entrar dentro do animal para não morrer de frio. As condições extremas de clima levam Glass ao teste máximo de resistência, especialmente em sua péssima condição, mostrando a incansável força do espírito humano.

A direção, como sempre, é primorosa; Iñárritu se vale de tomadas de um take só de traveling para detalhar o máximo possível o ambiente e as ações nos momentos chave em que elas acontecem. Essa técnica é muito usada por diretores medíocres, como M. Night Shyamalan, mas do jeito errado. Shyamalan usa o recurso a todo momento, até mesmo em cenas onde não acontece nada, só para esfregar o estilo de tomada nas nossas caras, sem consequências maiores para a trama. Iñárritu faz o mesmo, mas com precisão cirúrgica, capturando toda a tensão e todo o caos dos momentos que realmente devem ser capturados com essa técnica, nos dando uma experiência sem igual. O IMAX expande e engrandece ainda mais essa experiência na imersão da tela grande, e a trilha sonora pontuada do filme nos proporciona os momentos de tensão e suspense necessários para fazer da narrativa algo grandioso e de enormes consequências.

Tudo isso, temperado com a atuação primorosa de DiCaprio, e que, pelo visto, tem grandes chances este ano de faturar uma estatueta. A sua atuação neste filme começa aos berros e com algumas falas, mas depois do encontro com o urso, sua atuação é contida e silenciosa, contrastando sua energia inicial com o luto e o sofrimento de sua tragédia pessoal. Já está mais do que na hora de a academia valorizar este excelente ator que já nos brindou com tantas e memoráveis atuações em seus filmes anteriores, como Shutter Island, The Wolf of Wall Street, Inception, e assim por diante.

Baseado em uma história fantástica de sobrevivência, The Revenant nos traz toda a crueldade e selvageria de ambientes inóspitos, aliada a do próprio homem; desta forma, o protagonista terá que enfrentar dois inimigos: a natureza e a si próprio. E com isso, provar que a força do espírito humano resiste até mesmo à mais violenta intempérie, ao mais forte furacão, e ao mais intenso frio. O abandono não é uma escolha aqui para Hugh Glass, e assim também considero eu que perder este sensacional filme não é uma escolha para quem realmente gosta de uma narrativa instigante e cheia de surpresas, uma narrativa digna de prêmios, uma história avassaladora e que te deixará atento a cada detalhe e a cada virada. Recomendação máxima!

The Revenant (2015)
Título em português BR: O Regresso

Direção: Alejandro González Iñárritu
Produção: Steve Golin, Alejandro González Iñárritu, David Kanter, Arnon Milchan, Mary Parent, Brett Ratner, Keith Redmon, James W. Skotchdopole
Roteiro: Mark L. Smith, Alejandro González Iñárritu (baseado em fatos reais e na novela de Michael Punke)
Trilha sonora: Carsten Nicolai, Ryuichi Sakamoto

Estrelando: Leonardo DiCaprio, Tom Hardy, Domhnall Gleeson, Will Poulter, Forrest Goodluck, Paul Anderson, Kristoffer Joner, Joshua Burge, Duane Howard, Melaw Nakehk'o, Fabrice Adde, Arthur RedCloud, Christopher Rosamond, Robert Moloney, Lukas Haas, Grace Dove, Isaiah Tootoosis

Trailer:

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