Wednesday, February 27, 2019

NO CINEMA: Vice

8,5 / 10
Filme sobre vice-presidente americano da era George Bush traz o debate político dando voz para todos os lados se manifestarem.

Confira minha opinião!

Título brasileiro: Vice
Direção: Adam McKay
Estrelando: Christian Bale, Amy Adams, Steve Carell, Sam Rockwell, Tyler Perry, Alison Pill, Jesse Plemons, Alex MacNicoll, Aidan Gail, Cailee Spaeny, Colyse Harger, Lily Rabe, Violet Hicks, Justin Kirk, Don McManus, LisaGay Hamilton, Stephen Adly Guirgis, Matthew Jacobs, Shea Whigham, Eddie Marsan, Adam Bartley, Kirk Bovill, Jillian Armenante, Bill Camp, Alfred Molina, Naomi Watts, Paul Yoo


Você aí do outro lado da tela que está lendo o que eu estou escrevendo: todos vocês sabem muito bem que eu tento manter esse debate político o mais longe possível do meu endereço virtual. Só que quando o assunto do filme que eu fui assistir hoje é política, meu caro, não tem como se manter distante disso, concorda? Eu tenho que debater política, então vamos falar do mundo político. Mas não briguem, por favor! E quando eu acabar de escrever isso daqui, o debate político vai ficar restrito a essa postagem!

Pois muito bem, eis a minha pergunta para você: você é um cara de esquerda, ou de direita? Dependendo do seu espectro político, você pode ter uma interpretação sobre este filme. Eu tenho a minha, mesmo sabendo da posição dos envolvidos no filme, e quem me segue, sabe que meu espectro político está mais à direita, mas até mesmo o próprio filósofo, o professor Olavo de Carvalho, que é um cara que eu respeito e gosto de ler (mas não acho infalível), reconhece que há coisas a se aprender com a esquerda, muito embora ele seja aclamado pelo outro lado da moeda.

Dick Cheney, vice-presidente da época do presidente americano George W. Bush Jr. (uma das maiores bestas quadradas que já passaram pela política americana) era um cara que se identificava com o partido dos Republicanos, obviamente um partido com espectro mais à direita. Partindo dessa premissa, depois que você assistir esse filme você começa a entender porque o partido Republicano ficou tanto tempo sem ganhar uma eleição, sendo tão mal representado do jeito que foi! E olha que eu considero o presidente atual Donald Trump um cara que obviamente não é nada democrata, mas também não é muito republicano, digamos assim, mas todos nós sabemos que o Trump definitivamente não é do espectro da esquerda, isso nem sequer passa pela cabeça discutir, ele é do espectro da direita, isso é ponto pacífico.

Mas voltando ao Dick Cheney: o filme se preocupa em mostrar a trajetória do dono da Haliburton e político americano influente, que foi secretário de gabinete e chegou à vice-presidência da república sendo um cara muito bom de lábia, como o próprio filme faz questão de destacar; ele tinha um poder imenso de convencer você da ideia dele. E foi dessa forma que ele conseguiu se garantir no poder durante tantos anos, mesmo na época do presidente conservador Ronald Reagan, um presidente americano que eu admiro muito e que não sei se teve tanta influência do Cheney, não sei dizer a extensão do relacionamento deles, se houve, mas sei que Cheney foi um dos caras que o apoiou para a presidência na época e que esteve com ele em algumas ocasiões.

Pois bem, esse cara representa um ponto na história americana que a gente tem que analisar com muita calma, porque ele foi um articulador silencioso no parlamento americano durante muitos anos, e mesmo seus biógrafos admitem não ter tantas informações sobre a vida dele, uma vez que ele sempre foi muito reservado. O filme chega até a fazer essa observação no seu começo: para atentarmos que o filme é o mais preciso que conseguiu ser, dada a ausência de certos dados, mas que tentaram fazer o melhor que puderam. 

Foi Cheney, por exemplo, que se aproveitou do escândalo de Watergate na época de Richard Nixon, para se elevar ao poder; também foi ele o responsável por deflagrar a guerra da época do atentado do WTC. Eu acho que não precisamos ter reservas em afirmar que Dick Cheney foi com toda certeza uma espécie de monstro que o parlamento dos Estados Unidos criou. Mas um monstro para quem? Aí é que está. O lance do filme é o seguinte: não importa se você é um cara de esquerda ou de direita. o filme tem um viés claramente um pouco mais voltado para a esquerda, muito embora às vezes ele não mostre. Mas por que isso acontece? 

Porque o filme abre debate para as duas vias. Não importa se você é um "liberal", que é como eles identificam os esquerdistas nos Estados Unidos, ou então, um "right-wing", ou seja, direitista, você vai acabar vendo os dois lados da esfera política impressos no filme, seja de uma forma, seja de outra. Você vai acabar vendo os dois lados da história. E esse é um caso raro no cinema americano recente, porque outros filmes que tiveram, por exemplo no ano passado, eles não abrem debate para o lado da direita, eles ficam no ladinho deles, eles não mostram o outro argumento, eles não mostram as personalidades adversárias do argumento.

Quando por exemplo, que eu iria imaginar ver um filme americano de viés claramente mais voltado à turma do Bernie Sanders, tentar entender e explicar as ações do seu adversário do lado da turma do Paul Joseph Watson? Ou quando, por exemplo, que eu achei que iria ver um filme americano de Hollywood mostrar um cara como o Alex Jones da InfoWars, em um ponto do filme ele aparece; ou então o Mike Pence, atual vice-presidente americano, a própria Fox News, que tem um viés claramente direitista. Eu achei que isso era uma coisa que eu jamais iria ver, e o próprio diretor do filme junto do ator Christian Bale vão lá e deflagram a vida política no parlamento americano, sem tanta preocupação com o viés político mas também ilustrando e dando nome aos bois.

Eu havia falado lá em cima que o Dick Cheney acabou se tornando um monstro, e perguntei "para quem?"; no final do filme, você vê o Christian Bale interpretando o Dick Cheney quebrando a quarta parede e se explicando para nós, a audiência, porque fez o que fez, porque que mandou atirar bombas no Iraque, porque ele resolveu entrar nessa guerra que nem era função dele, uma vez que ele era vice do Bush, e quando você vê o cara falando, você percebe que o cara teve uma razão para fazer aquilo, razão essa que pode ser até mesmo de nível pessoal, ou mesmo torpe, mas diga-me uma coisa: como você combate monstros como Osama Bin Laden, a Al-Qaeda, Saddam, e outras personalidades hediondas da história da humanidade, seja Stalin, Hitler, Fidel, Kim Jong-un, Lula, Maduro, e por aí vai? Como fazer isso sem se transformar também em um monstro? 

Esse é o ponto principal, e é isso que a interpretação do Christian Bale vem trazer para nós: o que o Dick Cheney fez na época foi correto? Para mim não, mas ele fez por uma razão específica, e ele acreditava estar completamente correto naquilo que fazia. E foi fazendo essas coisas que ele mudou o curso do mundo, para o bem, ou para o mal. E quem viveu esse tempo como eu vivi (tinha meus 20 anos na época), sabe que foram tempos muito difíceis. O diretor Adam McKay, que tem suas críticas ao Donald Trump, muito por seu viés mais a esquerda, até ele tem a coragem de admitir que o atual presidente não chega nem perto de ser o desastre que foram Bush, Cheney, e todos esses caras do início deste século, PROVANDO MAIS UMA VEZ o acesso de loucura da grande mídia que só sabe atacar o cara, da mesma forma que ela ataca o presidente brasileiro Jair Bolsonaro aqui no Brasil, criando um monstro, uma entidade, que simplesmente não existe.

O filme não só traz esse debate, mas também o traz para o mundo atual; você vê um grupo de pessoas em uma instituição, debatendo. Algumas são de direita, e outras são de esquerda, então você vê o cara que parece muito com o Bill Murray (talvez vocês não saibam, mas o Bill Murray é apoiador do Donald Trump) e você vê também um outro cara lá do lado do Bill Murray cover, que é claramente de esquerda, discutindo política, e aí quem acompanha o cenário americano, sabe muito bem o que está acontecendo por lá! Um chama o outro de "lib-tard", o outro responde xingando o eleitor do Trump, e aí os dois começam a ir para as vias de fato e se darem porradas!

Poxa vida, mas é exatamente isso que acontece no mundo moderno em que a gente vive! Dois lados brigando, um se recusa a conversar com outro, ou seja, o filme acaba fazendo alusão àquela esquete cômica do John Cleese, no Monty Python, onde ele fala que os extremos não querem se comunicar para resolver os problemas, mas sim para estarem certos, então você escolhe o extremo e o defende, e aí você se sente bem com isso. Muito embora eu acho que você não pode ficar em cima do muro hoje em dia, e tem sim que mostrar o lado que você defende, por outro, eu não posso deixar de concordar com esse argumento de que os lados não querem mais conversar, apenas brigarem e estarem corretos de uma forma ou de outra, mesmo que tenham que partir para a porrada.

Isso me lembra também um grande professor canadense que eu tenho profunda admiração, Jordan B. Peterson, tendo até comprado e lido aquele livro maravilhoso dele, 12 Rules for Life; ele é um cara que consegue articular um debate tanto com pessoas da direita, quanto com pessoas da esquerda, e eu sempre tento fazer muito como ele, eu confesso aqui agora que eu tenho Jordan Peterson como uma inspiração para mim, porque ele é um cara que ao mesmo tempo mostra empatia pelo seu ponto de vista, e depois mostra porque ele concorda ou discorda de você de uma forma que você realmente fica convencido, fazendo um paralelo com isso que o filme mostra, e não há prova maior disso em ele ir a um programa do Bill Maher, um apresentador de TV progressista, e receber um elogio do cara.

A gente começa a ter todos esses relances na cabeça e ver que essa discussão é uma discussão que já vem sendo travada desde lá de trás não é uma coisa recente que começou a acontecer agora, é algo para a qual a sociedade estava dormindo até alguns anos atrás, por isso que não saíam discussões acaloradas nesse sentido, mas dentro da esfera do poder, já era algo que estava sendo alimentado há muito tempo!

Bom, partindo para a esfera técnica e artística agora, eu gostei muito da forma que o filme contou a história, tem até um narrador no filme, é um narrador que eu nunca vi desta forma. Vocês vão ficar surpresos com a forma que o filme enfiou narrador lá! Também a atuação perfeita do Christian Bale, e a maquiagem dele, a transformação dele no Dick Cheney que eu achei sensacional, eu gosto muito do Christian Bale, sou fã dele e desse talento dele de se transformar, admiro muito a capacidade que ele tem de interpretar qualquer tipo físico que você queira, e até mesmo a nível comportamental, ele emagrece, engorda, muda a aparência, faz uma maquiagem violenta, se esconde MESMO por trás do personagem que ele interpreta; você não vê mais o Christian Bale, você vê o personagem. Isso é uma característica absolutamente admirável no histórico do Christian Bale. Ano passado eu lembro de ter visto o filme Darkest Hour, onde o ator Gary Oldman faz a mesma coisa, ele se esconde por trás do personagem do Winston Churchill, e agora este ano, o Christian Bale vem trazer essa grande surpresa para a gente junto com esse debate político que parece interminável.

Por essa razão, eu recomendo muito que você, seja um cara de direita, seja um cara de esquerda, assista esse filme! Não para continuar em cima do muro, mas sim para assumir um lado que você acha o mais certo. O próprio filme se preocupa com isso, ele é um filme de caráter liberal-democrata, mais à esquerda, ele não se intimida, e mostra isso, mas ao mesmo tempo ele consegue dar voz para a direita se manifestar no filme também, então existem pontos no filme onde você se identifica e pontos claro que você não se identifica; há uma parte que você percebe que vai parecer que é o Alex Jones falando lá, e há partes em que você vai sentir como se fosse um discurso do Bernie Sanders. Ou seja, independente de qual lado você esteja, esse é um filme que eu considero muito legal e muito importante para a gente poder enriquecer mais esse debate, e quem sabe, num futuro próximo, conseguir chegar num entendimento, porque eu acho que as pessoas não podem ficar discutindo essas coisas para o resto de suas vidas, brigando, se desentendendo, sem jamais chegar em um ponto em comum, nessa parte, eu concordo com a análise do Cleese lá na esquete do Monty Python.

Creio que esta semana foi a última semana do filme em cartaz aqui no Brasil, essa sessão que eu fui assistir acredito que foi a última, mas quando você tiver a chance de assistir esse filme, vá,  assista! Tem algumas falhas, mas é bem dirigido, bem roteirizado, e passa sua ideia de forma bem eficiente. Eu recomendo altamente que você assista, sendo você uma pessoa que goste ou não goste de política, assista o filme, você pode tanto se impressionar com a articulação do debate político que ele promove, ou talvez apenas se impressionar com o caráter técnico e artístico que ele apresenta. Mas de qualquer forma, não perca.

Vice (2018)

Produção: Brad Pitt, Will Ferrell, Dede Gardner, Jeremy Kleiner, Adam McKay, Kevin Messick, Megan Ellison
Roteiro: Adam McKay
Trilha sonora: Nicholas Britell

Trailer:

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